quarta-feira, 15 de junho de 2011

O dia em que ganhei a primeira causa

Entendo que não é exatamente correto falar sobre os casos que acontecem no escritório ou sobre as audiências com terceiros, provavelmente menos ainda sair fazendo comentários na internet, mas considerando as circunstâncias eu meio que necessito compartilhar esse sentimento com as pessoas, e acredito que o melhor lugar seja aqui no Direito de Boteco, inclusive porque espero que em certo momento de nossas carreiras todos possamos passar por isso. Digo também que tentarei ser o mais genérico possível, para evitar quaisquer espécies de reconhecimento dos envolvidos.

O negócio é que hoje ganhei minha primeira ação por mérito próprio, e foi legal pra caramba. Sabem quando você faz algo em que acaba com aquele sorriso imbecil na boca e não consegue mais tirar? Foi mais ou menos assim que sai da sala de audiência.

Pois então, hoje ocorreu uma audiência e, como sempre, fui cumprir meu humilde papel de preposto lá no Juizado Especial Cível (está na lista fazer um post sobre o que é o JEC e como o vejo funcionando), era uma de instrução, então além de atrasar como quase sempre – marcada para dez horas da manhã e começar às onze e meia - , bem capaz demoraria um bom tempo. Ao começar já percebi que eu havia sido preposto também na de conciliação do mesmo processo ainda em 2010, então lembrei mais ou menos os acontecimentos que, para evitar qualquer conflito moral, direi apenas que o autor reclamava sobre cobrança indevida, aquela velha história de “não fiz essa compra com o cartão e estão me cobrando mimimi”. Eu e meu patrão estávamos pelo banco e outro advogado estava pela empresa envolvida, acompanhado da proprietária da mesma.

Colhidos os depoimentos do autor e da requerida, o advogado da empresa requereu a juntada de alguns comprovantes de compras efetuadas com o cartão, todos devidamente assinados, tendo o juiz acatado e dando prazo para impugnação, importante dizer que ao ser questionado sobre a autenticidade das assinaturas o autor respondeu que aquelas não eram assinaturas dele e nunca havia visto tais recibos. Daí foram ouvidas as testemunhas, e isso é meio chato então vou pular para a parte importante: a hora de assinar o termo de depoimento (sinceramente, não sei se esse é o nome correto). Nesse momento não tão solene, enquanto todos assinavam eu dei uma olhada boa no autor, e ao ver as mãos percebi que a assinatura ali era extremamente parecida com a dos recibos juntados minutos antes, justamente aquelas que ele não havia reconhecido como suas. Liguei meu modo malandrops, dei um cutucão no meu chefe e falei: “doutor, a assinatura dele ali na ata tá igualzinha a dos comprovantes que ele negou”. Aí rolou o estalo. O cara chamou o outro advogado pro lado, mostrou, deram aquela conversada, voltaram para a mesa, e nada mais fizeram além disso. Eu sabia que havia notado algo importante, mas pensei que acabaria passando batido.

Audiência vai, audiência vem e chegamos ao final. Antes do juiz dar a sentença, abre espaço para a advogada do autor impugnar os documentos apresentados, o que ela realmente faz alegando que os recibos contem assinatura falsa, podem ser motivos de fraude e tudo mais esperado, o que estaria correto não fosse a nossa carta na manga. Como o nosso colega juntou os documentos, nada deveria ser impugnado por ele, mas eu e meu patrão poderíamos pedir a palavra, o que foi feito, daí sim, jogamos na mesa o fato então obtido sobre as assinaturas, confirmando, por fim, a autenticidade das dívidas. O juiz fez uma cara de espanto, deu uma olhada e lançou um “é, doutores, nessas horas que nós vemos a importância do contraditório, né não?”.  Proferida a sentença de extinção sem julgamento de mérito (o que para nós já era bom o suficiente) a um bom contragosto da advogada do autor, que garantiu um futuro recurso, assinamos a ata e fim de jogo.

Ao final o juiz veio falar que foi realmente esperto termos notado isso ali, e foi então que meu chefe falou: “olha, doutor, dessa vez tenho que admitir que o ganhador dessa causa foi o Vinícius aqui, não fosse ele ter notado a assinatura, eu mesmo nunca a teria percebido”. Não vou negar que meu ego inflou um bocado daí pra frente. O juiz perguntou se eu era o estagiário, disse que era a hora de me darem um aumento e por aí vai... acho que só quem não curtiu muito a situação foram os autores mesmo, obviamente.

A satisfação, mesmo sabendo que não foi aquela coisa de outro mundo, foi enorme, de verdade. Receber os parabéns e saber que você fez a diferença em algo assim, e ser reconhecido por isso, é muito gratificante. Me prometeram também um churrasco para comemorar minha primeira e precoce vitória numa audiência, quero até ver onde isso vai parar!